Matéria negra

Jasem Mutlaq

Os cientistas estão agora muito confortáveis com a ideia que 90% da massa do universo está em uma forma de matéria que não pode ser vista.

A despeito de amplos mapas do universo próximo que cobrem o espectro de rádio até raios gama, temos conta de apenas 10% da massa que deve estar lá fora. Como Bruce H. Margon, um astrônomo da Universidade de Washington, disse ao New York Times em 2001: é uma situação muito embaraçosa admitir que não podemos encontrar 90% do universo.

O termo usado para essa massa perdida é matéria negra, e estas duas palavras resumem muito bem tudo que sabemos sobre isto até agora. Sabemos que existe matéria, porque podemos ver os efeitos de sua influencia gravitacional. De qualquer forma, a matéria não emite qualquer radiação eletromagnética detectável, portanto é escura. Existem várias teorias para justificar a massa perdida, passando por partículas subatômicas exóticas, uma população de buracos negros isolados, até menos exóticos duendes marrons e brancos. O termo massa perdida pode ser enganador, pois a massa não está perdida, apenas é leve. Mas o que exatamente é matéria negra e como sabemos realmente que existe se não podemos vê-la?

A estoria começou em 1933 quando o astrônomo Fritz Zwicky estava estudando os movimentos de um enorme e distante ajuntamento de galáxias, especificamente o agrupamento Coma e o agrupamento Virgem. Zwicky estimou a massa de cada galáxia no agrupamento baseado em sua luminosidade, e adicionou a massa de toda a galáxia para ter uma massa total do agrupamento. Ele fez então uma segunda estimativa independente da massa do agrupamento, baseado o afastamento em velocidade das galáxias individuais no agrupamento. Para sua surpresa, esta segunda massa dinâmica estimada era 400 vezes maior que a estimativa baseada na luz da galáxia.

Ainda que a evidência fosse forte na época de Zwicky, apenas nos anos de 1970 os cientistas começaram a explorar esta discrepância abrangentemente. Foi nesta época que a existência da matéria negra começou a ser considerada seriamente. A existência de tal matéria não apenas resolveria o deficit de massa nos aglomerados de galáxias; traria também maiores consequências na evolução e destino do próprio universo.

Outro fenômeno que sugeria a necessidade de matéria negra é a curva rotacional das galáxias espirais. Galáxias espirais contém uma grande população de estrelas que orbitam o centro galáctico em órbitas circulares próximas, muito semelhante a planetas orbitando uma estrela. Como órbitas planetárias, as estrelas com órbitas galáticas grandes deveriam ter velocidades orbitais menores (isto é apenas uma aplicação da terceira lei de Kepler). Realmente, a terceira lei de Kepler apenas se aplica a estrelas perto do perímetro de uma galáxia espiral, porque assume que a massa contida em uma órbita é constante.

Contudo, astrônomos fizeram observações das velocidades orbitais de estrelas nas partes externas de um grande numero de galáxias espirais e nenhuma delas seguia a terceira lei de Kepler conforme o esperado. Em vez de cair em raios largos, as velocidades orbitais permaneciam deveras constantes. A implicação é que a massa contida por órbitas de raios largos aumenta, mesmo para estrelas que aparentemente estão próximas da beirada da galáxia. Enquanto elas estão próximas a beirada da parte luminosa da galáxia, a galáxia tem um perfil de massa que aparentemente continua bem alem das regiões ocupadas pelas estrelas.

Aqui está outra forma de pensar sobre isso: considere as estrelas próximas ao perímetro de uma galáxia espiral, com velocidades orbitais típicas observadas de 200 km por segundo. Se a galáxia consistisse somente de matéria que podemos ver, estas estrelas muito rapidamente voariam para fora da galáxia, porque as suas velocidades orbitais são quatro vezes maiores que a velocidade de escape da galáxia. Como as galáxias aparentemente não estão se partindo, deve haver massa na galáxia que desconhecemos, quando adicionamos tudo que podemos ver.

Várias teorias apareceram na literatura para dar conta da massa perdida como WIMP (Weakly Interacting Massive Particles), MACHOs (MAssive Compact Halo Objects), buracos negros primordiais, neutrinos pesados, e outras; cada uma com seus pros e contras. Nenhuma teoria isolada foi ainda aceita pela comunidade astronômica, porque não temos até agora os meios para testar uma teoria contra outra conclusivamente.

Dica

Você pode ver os agrupamentos de galáxias que o Professor Zwicky estudou para descobrir a matéria negra. Use a janela encontrar objeto do KStars Ctrl+F) para centralizar em M 87 para encontrar o agrupamento Virgem, e em NGC 4884 para encontrar o agrupamento Coma. Você pode precisar aproximar para ver as galáxias. Note que o agrupamento Virgem parece ser muito maior no céu. Na realidade, Coma é o agrupamento maior; ele parece menor apenas por estar bem mais longe.